the journey to the east
If only you could see what I've seen with your eyes

Tuesday, October 11, 2005

há coisas que ninguém quer perder

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Gostei muito de Alice, gostei logo no início da escuridão da sala. Fiquei a pensar …bom antigamente o cinema português tinha uma qualidade de som deplorável agora deve ser moda fazer filmes escuros.
Mas não, enganei-me.
A certa altura já estava a perguntar-me:
- Mas que raio, porque é tão escuro?
Passei do preconceito à questão.
Devo dizer que foi na cena da piscina que compreendi. Por essa altura estava já sem ar, e tudo me parecia um grande exercício de estilo… Mas o azul e a luz da piscina, aliás toda a sequência, fez-me acreditar no filme. Tinha deixado de ser aflitivo e passado a ser acolhedor. Se é que alguma vez podia ser. Naquela pausa para respirar senti que estava a ser respeitada, que me queriam contar uma história e contavam com a minha atenção.
O filme passa a ser estranhamente quente, existe na chuva, no nebuloso, uma luz fraca que resulta em agasalho. Faz lembrar aquela luz que acendemos quando vamos espreitar um bebé que está a dormir e não o queremos acordar, vamos só confirmar que está bem…

Somos deixados nessa luz com uma história assustadora. A história de como sobreviver à perda de alguém que amamos, como encontrar um sentido para aceitar esse facto, quando nada parece fazer sentido? Como é que controlamos a realidade? Povoamos as cidades de câmaras até encontrarmos o que queremos? Como aceitar o vazio sem reagir? é preciso fazer alguma coisa para encontrar?

Como Mário Cláudio pergunta in Amadeu "Na trama de relações que constituem a história (...) somos nós que nos buscamos ou o encontro objectivo que se dá?"

E se é preciso ir em busca de, para encontrar, para que é que serve uma estratégia, para nos enredarmos nela?
A estratégia ou quotidiano apenas talvez sirva para suportar a ausência, para conseguir sobreviver. No final do filme já sem distanciamento para poder acreditar. Mário ficou embrenhado na estratégia, tal como nós vamos ficando.

Para encontrar é preciso acreditar. Em todos nós, como nos rostos da multidão, falta acreditar. Estamos tão fechados dentro dos nossos mecanismos de ida e volta, onde todos os acessos são circulares, que mesmo que esteja na nossa frente outra realidade, já não acreditamos… estamos loucos.

Já perceberam porque gostei?