Gostei muito de Alice, gostei logo no início da escuridão da sala. Fiquei a pensar …bom antigamente o cinema português tinha uma qualidade de som deplorável agora deve ser moda fazer filmes escuros.
Mas não, enganei-me.
A certa altura já estava a perguntar-me:
- Mas que raio, porque é tão escuro?
Passei do preconceito à questão.
Devo dizer que foi na cena da piscina que compreendi. Por essa altura estava já sem ar, e tudo me parecia um grande exercício de estilo… Mas o azul e a luz da piscina, aliás toda a sequência, fez-me acreditar no filme. Tinha deixado de ser aflitivo e passado a ser acolhedor. Se é que alguma vez podia ser. Naquela pausa para respirar senti que estava a ser respeitada, que me queriam contar uma história e contavam com a minha atenção.
O filme passa a ser estranhamente quente, existe na chuva, no nebuloso, uma luz fraca que resulta em agasalho. Faz lembrar aquela luz que acendemos quando vamos espreitar um bebé que está a dormir e não o queremos acordar, vamos só confirmar que está bem…
Somos deixados nessa luz com uma história assustadora. A história de como sobreviver à perda de alguém que amamos, como encontrar um sentido para aceitar esse facto, quando nada parece fazer sentido? Como é que controlamos a realidade? Povoamos as cidades de câmaras até encontrarmos o que queremos? Como aceitar o vazio sem reagir? é preciso fazer alguma coisa para encontrar?
Como Mário Cláudio pergunta in Amadeu "Na trama de relações que constituem a história (...) somos nós que nos buscamos ou o encontro objectivo que se dá?"
E se é preciso ir em busca de, para encontrar, para que é que serve uma estratégia, para nos enredarmos nela?
A estratégia ou quotidiano apenas talvez sirva para suportar a ausência, para conseguir sobreviver. No final do filme já sem distanciamento para poder acreditar. Mário ficou embrenhado na estratégia, tal como nós vamos ficando.
Para encontrar é preciso acreditar. Em todos nós, como nos rostos da multidão, falta acreditar. Estamos tão fechados dentro dos nossos mecanismos de ida e volta, onde todos os acessos são circulares, que mesmo que esteja na nossa frente outra realidade, já não acreditamos… estamos loucos.
Já perceberam porque gostei?
the journey to the east
If only you could see what I've seen with your eyes
Tuesday, October 11, 2005
há coisas que ninguém quer perder
Posted by Daniel Quinn at 1:00 PM